Como boicote ao Sónar Festival por ligações com Israel pode afetar as marcas?

Para as patrocinadoras, a polêmica relacionada aos vínculos da empresa que organiza o festival com Israel e com o conflito em Gaza pode ter repercussões relevantes em várias áreas

🔎 Foco da notícia 🔎

  • Cerca de 150 músicos e DJs estão boicotando o festival Sónar devido às ligações da sua empresa proprietária, a KKR, com investimentos em Israel, incluindo empresas em territórios ocupados na Cisjordânia.
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  • O Sónar reconheceu as preocupações geradas pela participação da KKR, mas distanciou-se das ações da empresa, afirmando não ter influência sobre seus investimentos.
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  • A controvérsia coloca as marcas patrocinadoras do Sónar numa posição delicada, com potenciais impactos negativos na reputação e imagem.

Uma onda de boicotes está agitando o mundo da música eletrônica, com cerca de 150 artistas e DJs assinando uma carta aberta pressionando o Sónar, um dos festivais mais importantes do gênero globalmente, a se distanciar da empresa de capital de risco norte-americana Kohlberg Kravis Roberts (KKR). A KKR adquiriu em junho do ano passado a Superstruct, uma empresa de entretenimento cujo portfólio de oitenta festivais inclui o Sónar.

O cerne da controvérsia reside nos investimentos da KKR em empresas sediadas em Israel ou com atividades no território, bem como, de acordo com uma investigação do jornal independente The Intercept, em assentamentos israelenses considerados ilegais na Cisjordânia.

Na carta, os artistas signatários, entre os quais se encontram nomes como Arca, Bas Grasmayer, Fever Ray, Kode9 e Loraine James, alegam que esses investimentos tornam a KKR “cúmplice do genocídio que Israel está cometendo em Gaza”.

É importante mencionar que esses artistas já se apresentaram em edições anteriores do Sónar ou estão agendados para se apresentar na edição deste ano em Barcelona, o principal evento do festival que também acontece em outras cidades, incluindo Lisboa, entre 12 e 14 de junho. O festival também já esteve no Brasil, com edições em 2004, 2012 e 2015, todas em São Paulo.

A ligação indireta da KKR a territórios ocupados também foi levantada por uma reportagem do The Intercept no início do ano passado. O artigo mencionava que o Yad2, um site israelense de anúncios classificados imobiliários, listava para aluguel apartamentos localizados em assentamentos ilegais na Cisjordânia.

A KKR detém uma participação minoritária na empresa alemã Axel Springer, um grupo de comunicação social que, por sua vez, controla a empresa imobiliária Aviv Group, responsável pela gestão do Yad2.

A carta aberta dos artistas, divulgada há pouco mais de uma semana, gerou uma resposta por parte do Sónar. Em comunicado, o festival expressou solidariedade com a população palestina em Gaza e reconheceu que “compreensivelmente, a participação da KKR como investidora no setor dos festivais gerou questões e incerteza”.

O Sónar procurou distanciar-se das ações da KKR, afirmando: “O Sónar se distancia de qualquer ação tomada pela KKR. Não exercemos influência nem controle sobre seus investimentos ou decisões”.

Contudo, a resposta do Sónar não satisfez o movimento BDS (Boicote, Desinvestimento e Sanções), que a considerou “claramente insuficiente para desfazer os danos causados pela cumplicidade involuntária” do festival.

A pressão não se limita ao Sónar. Outros festivais geridos pela Superstruct Entertainment, como o DGTL e o Field Day, também enfrentam apelos da sociedade para romperem seus laços com a empresa, agora sob a alçada da gigante financeira KKR, devido aos seus investimentos em empresas ligadas à indústria de defesa e tecnologia israelense, em um momento de intensificação do conflito em Gaza.

Alguns festivais, como o DGTL, já se manifestaram publicamente, defendendo sua autonomia curatorial. No entanto, para artistas e parte do público, essas declarações não são suficientes, exigindo um rompimento completo com a estrutura financeira da KKR.

Possíveis impactos para as marcas

Este cenário coloca um paradoxo para festivais como o Sónar: sendo espaços político-culturais relevantes, como podem prosseguir se a sua sustentabilidade depende de um capital que representa outros interesses? A questão levanta também preocupações para as marcas que patrocinam e se associam a esses eventos, sobre como irão reagir a esta crescente controvérsia.

De fato, patrocinadores do Sónar, como Coca-Cola e McDonald’s são apontados na recente carta aberta como alvos oficiais do Movimento BDS.

Para as marcas que patrocinam o Sónar e oferecem campanhas, ativações e ações de Live Marketing no festival, a controvérsia em torno das ligações da sua empresa proprietária com Israel e com a guerra em Gaza pode gerar um impacto significativo em diversas frentes:

Reputação e imagem

A associação a um festival sob escrutínio por questões éticas e políticas pode manchar a imagem da marca. Consumidores cada vez mais conscientes e engajados podem ver o patrocínio como uma forma de endosso indireto às políticas da KKR, levando a um possível boicote ou críticas à marca patrocinadora.

Alinhamento de valores

As marcas buscam cada vez mais alinhar-se a eventos e causas que ressoem com seus valores e com os de seu público-alvo. O conflito entre os valores de inclusão e diversidade frequentemente associados a festivais de música e as alegações de cumplicidade com ações em Gaza podem criar uma situações desconfortáveis para os patrocinadores.

Pressão pública

Assim como os artistas, o público pode pressionar as marcas patrocinadoras a se pronunciarem sobre a situação e até a retirarem seu apoio financeiro ao festival, caso as preocupações não sejam devidamente endereçadas.

Escuta como parte integrante da estratégia

Embora escutar o público seja crucial, ceder a todas as demandas também representa um risco. Não há uma solução simples, mas considerar a escuta como parte integrante da estratégia do evento, e não apenas na gestão de crises, parece ser um ponto de partida fundamental.

Em resumo, a controvérsia coloca as marcas patrocinadoras numa posição delicada, exigindo uma análise cuidadosa dos riscos e benefícios de manterem sua associação com o festival. A forma como elas responderem a esta situação poderá ter implicações significativas para a sua reputação e relação com os consumidores.

Foto: Divulgação

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