É viável cobrar por experiências com marcas
A ascenção da ferramenta “experience” – que é o resultado do presencial com a amplificação nas redes para aproximação e afinidade das marcas com as pessoas – já era grande antes da pandemia. Marcas de todos os setores estão cada vez mais se voltando para as experiências como um pilar central de sua atividade de marketing. Faz sentido, dado que o apetite por experiências continue a crescer. Dados do mercado americano apontam que até 2023 a “ economia da experiência” deverá valer US$ 12 bilhões.
Agora, além desta necessidade pelos gestores de marketing soma-se o fato das pessoas estarem muito carentes por propostas diferentes, criativas e com alto astral para se divertirem e serem surpreendidas com coisas boas.
Um assunto que vem ganhando espaço nas conversas de quem é do ramo de experiência é a possibilidade das ações de brand experience pagas, cobrando literalmente uma taxa de entrada.
Este papo já vinha rolando naquele período de ouro lá por dezembro e janeiro de 2020 pré pandemia onde a quantidade de briefings e desenvolvimento de projetos foi surreal, avassaladora e histórica para o mercado. E volta agora.
Nesta semana a divulgação de uma pesquisa produzida pela Imagination dirigida por Tom Gray, diretor de estratégia da agência, demonstra com números que esta modalidade de entretenimento poderá estar entre nós logo ali na frente.
O estudo foi feito para entender como a cobrança pode mudar a percepção e o engajamento das pessoas, e se essa estratégia agrega valor para quem quer “entrar no universo de uma marca” e, claro, o resultado diante das expectativas criadas e como isso pode afetar a marca.
A pesquisa analisou 40 experiências pagas no Reino Unido e nos EUA, reunindo 30.000 pontos de dados, que foram analisados usando processamento das respostas em uma matriz modelada de acordo com a curva de conhecimento de outras pesquisas nesta área baseado em IA para entender o engajamento e o sentimento.
As descobertas foram interessante e até surpreendentes. A principal delas mostrou que 17% das conversas sobre experiências pagas foram recomendações, em comparação com apenas 1% para uma experiência gratuita; e as experiências pagas alcançaram o dobro da taxa de menções de marca e produto, em comparação com as gratuitas. Além deste resultado os especialistas em brand experience da Imagination chegaram a algumas constatações.
1. As experiências pagas geram um envolvimento mais profundo – as pessoas falavam de forma mais empolgada sobre a experiência paga, enquanto a conversa era mais superficial para as gratuitas. Analisando a duração da conversa, foram encontradas frases mais curtas, mais focadas em ganhos de curto prazo, usadas para eventos gratuitos, enquanto que com os pagos as avaliações eram mais longas e a linguagem mais emotiva.
2. Leads de maior qualidade – os preços dos ingressos funcionam como um filtro, o que significa que os participantes das experiências pagas estão predispostos à marca. O preço do ingresso filtra os participantes não-alvo e fora da categoria, além de reduzir drasticamente os não comparecimentos.
3. Mais valorizada pelos clientes – pesquisas de economia comportamental descobriram que as pessoas tendem a atribuir mais valor às coisas pelas quais pagam – vimos isso confirmado quando analisamos o tipo de linguagem usada para descrever as experiências. As experiências pagas resultaram em uma taxa mais alta de superlativos e advérbios, em comparação com experiências gratuitas, e uma taxa correspondente mais alta de recomendações.
4. Aproxima as pessoas do produto – experiências pagas geram duas vezes mais menções a marcas e produtos do que eventos gratuitos.
Os pesquisadores acreditam, com base nos cruzamentos desta descoberta com as pesquisas mercadológicas que, ao cobrar uma taxa de entrada para a experiência as pessoas mudam para uma mentalidade diferente, ou seja: elas investiram na experiência e estão mais dispostas e abertas a se envolver, se divertir e aprender algo novo.
Além disso o resultado reforça a mudança de percepção com o amadurecimento de uma geração de consumidores que levam à sério o ditado “se algo é grátis, eu é que sou o produto”.
De acordo com Tom Gray o mercado americano, base da pesquisa, apresenta hoje dois formatos para este tipo de ação. Um deles é a experiência paga sem a necessidade de ser comercialmente viável. Neste tipo de projeto o preço do ingresso faz parte da estratégia para atrair o público-alvo e com isso obter mais assertividade na execução e performance.
A experiência ” Ford vai mais rápido ” realizada em Londres, Paris e Madrid entre outubro e dezembro de 2017 é um exemplo e também fez parte da pesquisa. Os participantes pagaram cerca de U$ 100 e participaram da experiência “Go Faster” – que você leu em primeira mão aqui no promoview – onde receberam treinamento orientado por dublês profissionais de Holywood incluindo derrapagens e pilotagem em situação de fuga. A seguir foram para o set e participaram da gravação de uma cena de fuga de um assalto ao volante do veículo Ford.
Após quatro horas de atividades receberam o vídeo com a cena cortada editada além do pôster do filme com a imagem do participante, uma experiência que, se não é impossível, é caríssima para ser realizada individualmente.
O outro segue o caminho do que pode se consolidar como um novo modelo de negócios onde as marcas investem no que Gray chama de “economia da experiência”, realizando projetos de brand experience com metas de lucratividade tratando como um empreendimento independente do negócio principal.
Um exemplo pode ser o “Bumble Brew Cafe” criado pelo aplicativo de namoro Bumble em junho de 2021 aproveitando a volta às ruas das pessoas solteiras que passaram os últimos meses limitadas a contatos pelo zoom e facetime.
A marca abriu um café na 98 Kenmare St. em Manhattan, NY, ao lado do reconhecido restaurante Pasquale Jones, parceiro na iniciativa. “Saboreie comidas e vinhos deliciosos e conecte-se no app Bumble Brew. Existem pessoas interessantes ao seu redor” foi o mote da campanha que explorou o aspecto romântico ao lado de possibilidades como novas amizades e até mesmo realização de negócios entre os participantes.
O projeto foi um sucesso como estratégia de relações públicas, possibilidade de experiência presencial dos usuários com uma marca 100% digital e lucro, criando um novo fluxo de receita.
Estes projetos que mostram a disposição dos consumidores em pagar por experiências de marca podem ser atribuídos a alguns fatores.
As pessoas já vinham vivendo um processo de “desmaterialização” querendo possuir menos coisas para poderem viver mais experiências. Com a situação inédita criada pelo isolamento este sentimento cresceu junto com o desejo pelo contato humano e experiências únicas e prazeirosas.
O Lockdown levou a reflexão sobre o valor e benefícios psicológicos da convivência presencial e das situações que podem ser experimentadas.
Junto com isso estão as redes sociais que tornaram-se a moldura perfeita para as pessoas exibirem a sua identidade e reforçarem sua afirmação. E uma das melhores formas de fazê-lo é compartilhando imagens das experiências tanto para ilustrarem seu estilo de vida quanto para demonstrar aos seus amigos a lembrança afetiva expressando algo do tipo “você tinha que estar lá comigo”.
A oportunidade está aí e cabe aos profissionais de marketing, gerentes de marca, equipes de inovação ter clareza sobre o que estão tentando alcançar caso se arrisquem na direção das experiências pagas já que esta dinâmica pode obter ótima performance para algumas atividades, mas um desastre para outras.
O importante é realizar a avaliação correta sobre qual é a troca de valor que fará com que as pessoas estejam dispostas a desembolsar seu dinheiro, qual é o valor que as pessoas estão dispostas a pagar e quanto você pode cobrar e ser cobrado (como marca) por isso.
Se o resultado das respostas a essas perguntas for animador, é a hora certa de explorar experiências pagas no desenvolvimento de estratégias mais amplas para a marca que você defende abrindo inclusive possibilidades para novos formatos de negócios.